The most untranslatable word in the world
A "Saudade" portuguesa aparece em sétimo lugar numa lista das dez palavras mais difíceis de traduzir para inglês. A lista é o resultado de um inquérito patrocinado pela agência de traduções Today Translations, e envolveu cerca de um milhar de linguistas. Aqui vai a lista completa:
- ilunga [pessoa que perdoa tudo à primeira e à segunda ofensa, mas não à terceira (tshiluba, língua da família Bantu)]
- shlimazl [azarado crónico (yiddish)]
- radioukacz [telegrafista dos movimentos de resistência no lado soviético da Cortina de Ferro (polaco)]
- naa [partícula usada para emfatizar declarações ou exprimir concordância (regionalismo japonês)]
- altahmam [um tipo particular de tristeza profunda (árabe)]
- gezellig [aconchegado, acolhedor (holandês)]
- saudade
- selathirupavar [certo tipo de gazeta ou falta injustificada (tamil)]
- pochemuchka [perguntador excessivo (russo)]
- klloshar [falhado, perdedor (albanês)]
Estas listas são sempre divertidas, mas há que explicar melhor o que se quer dizer com "impossível de traduzir" quando na mesma linha se oferece uma tradução. A ideia central é que a palavra em si não é impossível de traduzir: Saudade pode ser traduzido para inglês como "longing" ou para alemão como "Sehnsucht", e algumas outras palavras poderão ser traduzidas não por uma única palavra mas sim por uma expressão composta. A questão fundamental é que as palavras em questão ocupam um papel central numa determinada cultura, o que significa que qualquer tradução para outro idioma é incapaz de transportar todo o contexto cultural que ressoa com essa palavra.
Este é no final de contas o problema fundamental da tradução, tão brilhantemente discutido no maravilhoso livro Le Ton Beau De Marot: In Praise of the Music of Language: para traduzir de forma perfeita um texto, temos de traduzir também todo o universo de referências culturais no qual esse texto nasce. Essa tarefa é obviamente impossível, ou dito de outra maneira, a única forma de a concretizar consiste em mergulhar na língua e cultura do texto original. Foi a opção que tomei há já vários anos, quando me fartei das ineficiências das leituras por pessoa interposta e tomei a decisão deliberada de deixar de ler traduções de inglês para português e passar a ler exclusivamente os originais em inglês. A opção alternativa consiste em aceitar que a tradução completa é impossível - "Traduttore, Traditore" - e valorizar antes a ideia de transposição hibridizante. Douglas Hofstadter ilustra de forma exemplar no seu livro a ideia de que a tradução pode ser um trabalho profundamente criativo, e que o texto original pode ser enriquecido pelas novas leituras e contextos proporcionados por uma boa tradução.
Há tempos deparei-me com outra palavra portuguesa ainda mais difícil de traduzir para inglês/francês que "saudade": "namorar". Atenção que quero dizer namorar no seu verdadeiro sentido em português e não "sair com alguém".
Posted by: António | 2004.06.29 at 15:03