Vi ontem uma boa parte do debate entre os líderes dos cinco partidos com assento parlamentar, e a má prestação de Santana Lopes foi flagrante. A escolha de indumentária não foi feliz: Quando percebi que Santana tinha escolhido uma gravata preta em sinal de luto pela morte da pastorinha de Fátima, tive um ataque de riso incontrolável. Talvez Santana pressentisse já o luto de si mesmo... Haverá concerteza maneiras mais espectaculares de dar um tiro no pé, mas este detalhe há de ficar registado como um dos momentos de pior mau gosto dos anais da política portuguesa.
O cansaço e falta de élan de Santana foram mais visíveis neste debate do que em qualquer outro momento desta campanha. Mesmo Paulo Portas, cujos dotes oratórios são consideráveis, apareceu algo apagado, triste mesmo. Talvez ambos tenham acesso a dados que ainda não são do domínio público, ou talvez seja simplesmente o desgaste desta relação desigual a começar a fazer os seus danos.
Sócrates e Louça estiveram ambos bem, interpretando papéis diferentes: Sócrates tentou dar uma imagem de estadista, mais interessado em mostrar liderança e firmeza de propósitos do que dotes sofísticos, enquanto que Louça como habitual jogou a cartada da autoridade intelectual. Ambos os papéis têm os seus pontos fracos: o discurso de Sócrates permanece sempre algo vago, não se comprometendo com meros detalhes, o que pode por vezes dar uma imagem algo arrogante, enquanto que o domínio superior que Louçã tem da maioria dos dossiers se reflecte por vezes numa atitude pontificante e um pouco condescendente. No entanto não há estratégias perfeitas, e no cômputo geral ambos tiveram intervenções bastante eficientes para aquela que definiram como a sua audiência primária.
Os primeiros comentários noticiosos que li e ouvi relativamente a este debate dão relevo à participação de Gerónimo de Sousa, que se destacou precisamente pela presença muito pouco eficaz, por motivo de doença. Ora Gerónimo de Sousa é um líder sem dúvida mais mediático e humano do que Carlos Carvalhas, mas é provavelmente o líder menos preparado em termos de capacidade de argumentação, (excluindo como é óbvio Santana Lopes, que parece pensar que argumentar é coisa para argumentistas). O que Gerónimo de Sousa deu foi sinais claros de estar disponível para apoiar a governação do PS em caso de maioria relativa, o que talvez seja mais relevante para apreciar esta onda de simpatia.
As múltiplas manifestações de simpatia por Gerónimo de Sousa registadas em vários jornais nos tempos recentes não são certamente uma coincidência. Apesar da sua maior afinidade ideológica com as políticas do PSD, os donos dos média portugueses concluíram que Santana não é fiável e decidiram deixá-lo cair para dar lugar a um governo do PS. Para que o PS não se instale no poder de forma demasiado confortável, é necessário preparar o terreno para que uma vez reciclada a liderança do PSD rapidamente surja a oportunidade de o PS ser ejectado do trono. Como os média não podem atacar o PS pelo flanco direito, pois isso significa apoiar o PSD e aumentar a dificuldade de substituir Santana, resta o flanco esquerdo: apoiar o BE e a CDU para reduzir a margem de manobra do PS.
É verdade que desde a conquista de assento parlamentar que a cobertura mediática do BE tem vindo a crescer continuamente, facto a que não é alheio o carisma de políticos como Francisco Louçã. No entanto, a cobertura extraordinária que nesta campanha tem sido oferecida ao BE e em particular à CDU, o partido tradicionalmente enjeitado pela comunicação social, reflecte seguramente em muitos casos mais do que um desejo de isenção e de equilíbrio. Muita gente em Portugal está já a preparar não o pós-PSD mas antes o pós-PS.
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